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Caos Primordial

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09/12/23 a 06/04/24

Antes de tudo, havia o Caos

“Os primeiros homens criados e formados foram chamados de Feiticeiros do Riso Fatal, Feiticeiros da Noite, Os Desleixados e Feiticeiros Negros... Foram dotados de inteligência e sabiam tudo o que havia no mundo. Quando olhavam, viam instantaneamente tudo ao redor, e eles contemplaram a volta do arco dos céus e da face arredondada da terra... [Então o Criador disse]: "Eles sabem tudo... o que deveremos fazer com eles agora? Deixe que a visão deles alcance somente aquilo que está próximo; deixe-os ver somente uma pequena parte da face da terra!... Não são eles, pela própria natureza, simples criaturas resultantes de nosso trabalho? Deverão ser deuses também? “

— O Popol Vuh dos Maias Quiché.

“No princípio o deus Tupã morava no vazio, numa escuridão sem fim. Primeiro, Tupã criou o céu e as estrelas, onde fez sua morada e abaixo criou as águas. Depois, Tupã desceu lá de cima, em grande redemoinho. Logo que Tupã tocou as águas, o sol surgiu no arco do céu. Quando o sol chegou ao ponto mais alto, seu calor rachou a pele de Tupã. E finalmente, quando o sol desapareceu do outro lado do céu, a pele de Tupã caiu do corpo dele, se estendeu sobre as águas e formou as terras. No dia seguinte, o sol apareceu no céu e percebeu a mudança. O sol chegou novamente ao ponto mais alto e Tupã pegou um pouco de barro, amassou e moldou o primeiro Homem. Soprou-lhe o nariz e lhe deu vida. O Homem cresceu e ficou grande como Tupã, mas não falava. O grande deus soprou em sua boca e começou a falar. Então, Tupã soprou na orelha esquerda a inteligência e na orelha direita a sabedoria. Na cabeça do Homem, Tupã desenhou os raios e trovões sagrados que são os de pensamentos. No corpo do Homem, Tupã colocou as águas das emoções e dos desejos que se movimentam para criar ou para destruir. Por fim, Tupã deu ao Homem o poder de escolher entre criar e destruir. Terminada a criação, Tupã voltou para o céu montado em seu redemoinho. “

Fonte: CLARO, Regina. Encontros de história: do arco-íris à lua, do Brasil à África. São Paulo: Cereja, 2014, p. 4.
O Mito de Tupã, o Gênesis e o Big Bang buscam, cada um à sua maneira, fornecer explicações sobre a criação do universo, capturando a imaginação humana ao abordar o mistério fundamental de nossa existência. No entanto, ao indagar sobre o que poderia ter existido antes do Big Bang, entramos num território de conjecturas. O físico Stephen Hawking sugere que o tempo real da terceira dimensão é substituído pelo tempo imaginário, uma quarta dimensão do espaço. Essa abordagem desloca o tempo de sua natureza linear para uma entidade abstrata, oferecendo um prólogo intrigante ao capítulo 1 da existência, que é o Big Bang.

A concepção de um tempo imaginário desafia a rigidez das medidas convencionais e nos liberta para explorar o viver e criar a partir de paradigmas alternativos. Num espaço mental de infinitas possibilidades, onde a separação entre caos e ordem se dissolve, a existência se torna uma dança constante de movimento. Nesse contexto, tudo que existe é válido simplesmente por existir, e novos universos de referência emergem do caos, sendo sistematizados através de uma ordem que, em última instância, permanece um mistério.

A imutabilidade das ordens naturais, como o verão seguindo a primavera, a juventude sucedendo a infância e o rio desaguando no mar, é contrastada pela incerteza que envolve a origem dessas ordens.
Esse mistério, o tempero fundamental de nossa existência, está presente incessantemente no nosso cotidiano. Quem decide as características dos trópicos, o conteúdo de um coco e o aroma das flores permanece um enigma.

Ao confrontar esse mistério, o ser humano se engaja na criação como uma tentativa de decifrar o desconhecido. E dentro da sua própria radicalidade de existência, tenta, sem sucesso, explicar esse mistério a si mesmo.

A capacidade de criar torna-se, assim, uma expressão da tentativa de domar o inexplicável, de lançar luz sobre as sombras que permeiam nossa compreensão do mundo. Criamos não apenas por necessidade prática, mas como um ato instintivo de desvendar o que se desdobra diante de nós.
É na forja dessas experiências, que encontramos significado e conexão com o universo que nos cerca. A experiência, então, emerge como a ferramenta fundamental para explorar as complexidades da existência humana. Ao aceitar o papel central do mistério em nossa jornada, transformamos o desconhecido num terreno fértil para a construção de narrativas que dão forma, cor e textura à nossa percepção do mundo.

Fundamentalmente, as experiências moldam identidades. Cada encontro, desafio e triunfo contribui para a edificação singular do eu. Essas vivências esculpem nossas perspectivas, valores e emoções, servindo como alicerce sólido sobre o qual nossa identidade se ergue. Com o passar do tempo, torna-se evidente que a identidade não é uma entidade estática, mas sim um continuum dinâmico, uma intrincada teia de imprevisibilidades que enriquece a tessitura da vida com inúmeras nuances inexploradas. E aí encontramos a beleza que reside no caos.